Felizmente, não me dá muitas vezes para pensar no quanto eu imaginava a vida de adulta diferente. A minha e a dos outros. Há coisas a começarem por todos os lados. Da minha parte, vou rezando pelos fins das coisas. Mas fico feliz pelo princípio dos outros (eles que se amanhem).
Aqui da minha janela, vejo um motociclista caído no alcatrão. Não se mexe, não lhe tiraram o capacete... Vejo a cara dos polícias sem fé, um pouco dormentes do hábito destes acidentes. Mais cientes que ninguém que tudo mata.
No meu telemóvel, um nascimento. O recado que algures num hospital há sorrisos e entusiasmo (sem hábito) do milagre que é a vida e de mais uma alma neste mundo. Dá-me para pensar no meu sobrinho e em todos os que se foram sem justiça. Mas estou convencida que tem lógica.
A minha teoria, desde há muito (desde que comecei a ler Marion Zimmer Bradley, aliás) é que Deus era, no início do mundo, amante da Natureza. Tinham, os dois, uma relação sólida e estável, comprometida e profundamente apaixonada, até cometerem o erro crasso de resolver ter mais que animais de estimação. Até resolverem inventar que os animais eram muito mais interessantes se lhes pusessem inteligência...
Foi o princípio do fim. O Homem, enquanto crescia, cedo se apercebeu das fragilidades da sua Mãe. E, como um adolescente rebelde foi, desconsideradamente delapidando-a. Cortando a Sua presença, queimando os Seus pulmões, contaminando o Seu sangue, partindo-Lhe o coração. Com a mesma (in)consciência com que os filhos agem, mentalizados que Mãe tudo pode, tudo aguenta...
Mas Mãe é mulher. Tem limites e fragilidades, e agora (vejo árvores a serem cortadas em prol de mais faixas nas ruas, de edifícios mais feios, de merdas) existe apenas uma réstia velha e, dentro do possível, generosa do seu antigo vigor.
Como pode um Pai perdoar aos seus filhos a morte do seu Amor? Não pode. Deus já não quer saber de nós porque não se pode apoiar um filho tão egoísta e destruidor. Escusamos, qualquer um de nós, de levantar os braços para o Céu e pedir-Lhe apoio. Ele tem toda a razão em ignorar-nos. Não merecemos nem pena nem piedade: filho que destrata a Mãe, merece tudo de mau que lhe possa acontecer.
Esta visão não é cínica, é justa. Nietzche não tinha razão porque Deus não morreu, apenas não está interessado no que os seus inventos mimados e inconscientes querem. Para Ele, tanto se lhe dá se nos matamos uns aos outros ou se damos cabo das nossas cabeças em trabalhos que nunca tiveram significado para a preservação da nossa casa. Que Pai não põe o seu filho de castigo se este destrata a Mãe - o seu primeiro amor, quem já cá estava antes?
O “Plano Divino” já não existe. Correu mal. Quem somos nós, principais autores do seu insucesso para nos sentirmos incomodados com isso? Somos o fim e a causa do fim de uma história de Amor. Deixámo-Lo revoltado, deixamo-La diariamente mais moribunda.
Quando morrer, quero que seja nas mãos da minha Mãe, na manifestação da sua Força e reacção a tanto de si ser destruído. Quero ir-me num incêndio, num furacão, num Tsunami, na erupção de um vulcão (embora não quero que me doa, enfim...).
Por mim, tudo o que Ela decidir está certo e muito longe de ser uma calamidade. Calamidade é o escape que lhe enfiamos pela goela dentro todos os dias, e não o facto de ela tossir, mexer-se ou chorar quando lhe apetece. Calamidade é não celebrarmos, dia a dia, a nossa Mãe - e não matarmo-nos nas mãos dos nossos irmãos ou Dela.
Olhando a janela, a Alma já foi. Só na minha cabeça imagino que tenha sido uma substituição pela outra que aquece na incubadora do Hospital. Desejo-lhe as boas vindas e que aproveite a inocência. Se for inteligente, daqui a duas dezenas de anos, aperceber-se-á da factura que tem em cima... Que seja o mais tarde possível.
Que os nossos Pais, principalmente a nossa Mãe, nos perdoe, acho impraticável. É que nós sabemos o que fazemos, mas nem por isso queremos saber.
quinta-feira, junho 23, 2005
Luv will tear us apart
Publicada por What's in a name? à(s) 13:47
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1 Comment:
Gostei de ler! :)
Vou voltando!
Filipe
P.S. - Belo nome, o do blog ;-)
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